quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Comandante do Concordia subestimou a natureza

Matéria interessante publicada no jornal A Tribuna de Santos.


Comandante italiano subestimou natureza, afirma especialista. Para diretor do Sindmar, oficial não priorizou segurança. 




O comandante do navio de cruzeiro Costa Concordia, Francesco Schetti, "subestimou a própria natureza", devido a sua experiência à frente de embarcações e por estar seguro do comportamento que adotou ao longo dos anos.

A análise é do comandante de longo curso Darlei Santos Pinheiro, especialista na navegação de petroleiros e diretor de Relações Internacionais do Sindicato Nacional dos Oficiais da Marinha Mercante (Sindmar). Para o navegador, Schettino não priorizou a segurança, o respeito ao meio ambiente e até a sobrevivência dos passageiros. "A segurança que ele atribuiu a seu comportamento dava uma tranquilidade para que pudesse ter essas ações.

Porém, eu costumava dizer aos oficiais de serviço: desconfiem sempre quando tudo está normal". O comandante do Concordia teve um desvio de conduta em relação a suas prioridades como gestor da embarcação, explica Pinheiro. De acordo com o especialista, Schettino colocou, em primeiro lugar, a cortesia a um tripulante do navio, deixando para segundo plano atitudes que deveriam ser tomadas para garantir e manter a segurança da navegação. "Se ele já tinha uma rota estabelecida, programada, ele jamais poderia desviar desse caminho. A atitude de cortesia deve ficar no final da fila. Na verdade, nem faz parte das prioridades", afirma o diretor do Sindmar, que também analisa o comportamento do italiano em relação à tecnologia disponível a bordo para evitar desastres.

Segundo Pinheiro, o comandante do Costa Concordia deve ter retirado a embarcação do piloto automático, medida normalmente adotada quando a navegação ocorre em mar aberto. Ele acredita que, no momento do naufrágio, o navio estava sendo pilotado manualmente. Nessa situação, tem um marinheiro ou oficial atendendo as ordens de manobra. Esse cenário explicaria o porquê de os alarmes que avisam o desvio de rota terem sido ignorados. "O entendimento que eu tenho é que a embarcação estava no manual. Então, o alarme deixou de existir para o piloto automático.

Os equipamentos de auxílio à navegação, quando programados para uma rota preestabelecida, alertam se a embarcação desviar", diz Pinheiro, referindo-se ao radar, ao medidor de profundidade e ao GPS, entre outros. No caso do Concordia, como o comando manual foi uma decisão de Schettino, os alarmes podem ter sido rejeitados. "Como estava no manual, justamente porque o comandante queria fazer essa cortesia, ele vai dispensar tudo isso". REAÇÃO

A reação do líder do Concordia, de ser um dos primeiros a deixar a embarcação, surpreendeu Pinheiro. Conforme o especialista, as regras internacionais exigem que o comandante cuide do navio em momentos de emergência. "Ele devia permanecer a bordo até por questão moral. Mas acredito que ele possa ter fugido para evitar o flagrante, para tentar um contato com o advogado, já que ele sabia que havia provocado o acidente".

Com base em informações divulgadas pela imprensa internacional, Pinheiro considera que a reação de Schettino foi condizente com seu comportamento habitual. Um ex-comandante de outro navio da Costa Cruzeiros (proprietária do Concordia), sob condição de anonimato, disse a jornais italianos que Francesco Schettino "era insolente, se fazia de esperto, era um palhaço. Eu não o condenaria uma vez, mas até dez vezes. As rochas estavam claramente assinaladas em todas as cartas náuticas". Já outro oficial, que trabalhava no Concordia, reiterou que "ele era autoritário, às vezes insuportável, com quem ninguém podia conversar".

O diretor do Sindmar acredita que, em parte, o comportamento de Schettino se deve ao stress da atividade, causado devido às inúmeras responsabilidades que são imputadas ao cargo. "Com as responsabilidades de hoje, o comandante fica muito sobrecarregado. No passado, o grande comando das embarcações era feito por pessoas até tiranas. Hoje modificou. O comandante tem que ser agregador, convencer o grupo de que a empresa que ele defende tem determinados propósitos". Pinheiro defende que a questão emocional, na formação do profissional que vai comandar embarcações, deve ser revista pela Organização Marítima Internacional (IMO).

Também merece ser reavaliado o regulamento das embarcações de passageiros de grande porte. "Está caracterizado um desvio da conduta apropriada para um comandante. O elemento humano é muito colocado em segundo plano. Para desempenhar uma função, é preciso preparar as pessoas para que criem um calo, para poderem lidar com mais tranquilidade quando tiveram grandes responsabilidades", conclui o comandante brasileiro.

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